sábado, 19 de setembro de 2009

PÚBLICO

0 comentários

O caso das escutas de Belém suscita a mais preocupante das perguntas: terá este jornal uma agenda política oculta?
A questão principal
Na sequência da última crónica do provedor, instalou-se no PÚBLICO um clima de nervosismo. Na segunda-feira, o director, José Manuel Fernandes ( J.M.F.), acusou o provedor de mentiroso e disse-lhe que não voltaria a responder a qualquer outra questão sua. No mesmo dia, J.M.F. admoestou por escrito o jornalista Tolentino de Nóbrega (T.N.), correspondente do PÚBLICO no Funchal, pela resposta escrita dada ao provedor sobre a matéria da crónica e considerou uma “anormalidade” ter falado com ele ao telefone. Na sexta-feira, o provedor tomou conhecimento de que a sua correspondência electrónica, assim como a de jornalistas deste diário, fora vasculhada sem aviso prévio pelos responsáveis do PÚBLICO (certamente com a ajuda de técnicos informáticos), tendo estes procedido à detecção de envios e reenvios de e-mails entre membros da equipa do jornal (e presume-se que também de e para o exterior). Num momento em que tanto se fala, justa ou injustamente, de asfi xia democrática no país, conviria que essa asfi xia não se traduzisse numa caça às bruxas no PÚBLICO, que sempre foi conhecido como um espaço de liberdade. A onda de nervosismo, na verdade, acabou por extravasar para o próprio mundo político, depois de o Diário de Notícias ter publicado anteontem um e-mail de um jornalista do PÚBLICO para outro onde se revelava a identidade da presumível fonte de informação que teria dado origem às manchetes de 18 e 19 de Agosto, objecto de análise do provedor. A fuga de informação envolvia correspondência trocada entre membros da equipa do jornal a propósito da crónica do provedor. O provedor, porém, não denuncia fontes de informação confi denciais dos jornalistas – sendo, aliás, suposto ignorar quem elas são –, e acha muito estranho, inexplicável mesmo, que outros jornalistas o façam. Mas, como quem subscreve estas linhas não é provedor do DN, sim do PÚBLICO, nada mais se adianta aqui sobre a matéria, retomando-se a análise que fi cou suspensa há oito dias.
Em causa estavam as notícias dando conta de que a Presidência da República (PR) estaria a ser alvo de vigilância e escutas por parte do Governo ou do PS. O único dado minimamente objectivo que a fonte de Belém, que transmitiu a informação ao PÚBLICO, adiantara para substanciar acusação tão grave no plano do funcionamento do nosso sistema democrático fora o comportamento “suspeito” de um adjunto do primeiro-ministro (PM) que fi zera parte da comitiva ofi cial da visita de Cavaco Silva (C.S.) à Madeira, há ano e meio. As explicações eram grotescas – o adjunto sentara-se onde não devia e falara com jornalistas –, mas aceites como válidas pelos jornalistas do PÚBLICO, que não citavam qualquer fonte nessa passagem da notícia (embora tivessem usado o condicional).
A investigação do provedor iniciou-se na sequência
de uma participação do próprio adjunto de José
Sócrates, Rui Paulo Figueiredo (R.P.F.), queixando-se
de não ter sido ouvido para a elaboração da notícia,
apesar de T.N. ter recolhido cerca de seis meses antes
a sua versão dos factos. O provedor apurou que na
realidade T.N., por solicitação de um dos autores da
notícia, o editor Luciano Alvarez (L.A.), já compulsara
no Funchal, logo após a visita de C.S., e enviara
para a redacção informações que se convergiriam
com aquilo que R.P.F. lhe viria a afi rmar um ano
depois (e que o correspondente entendeu não ter
necessidade de comunicar a Lisboa, convencido de
que o assunto morrera). Esses dados, contudo, não
haviam sido utilizados na notícia (foi por tê-lo dito na
crónica que o provedor recebeu de J.M.F. o epíteto
de mentiroso, não tendo recebido entretanto as explicações
que logo lhe pediu). O provedor inquirira
J.M.F e L.A. sobre as razões dessa
omissão mas não obtivera resposta.
Quanto ao facto de não se ter
contactado o visado para a produção
da notícia, como preconiza o
Livro de Estilo do PÚBLICO (“Qualquer
informação desfavorável a
uma pessoa ou entidade obriga a
que se oiça sempre ‘o outro lado’
em pé de igualdade e com franqueza
e lealdade”), respondeu L.A. ao
provedor: “Ao fi m do dia da elaboração da notícia, eu próprio liguei para Presidência do Conselho de Ministros [PCM], para tentar uma reacção de R.P.F., mas ninguém atendeu. Cometi um erro, pois deveria ter, de facto, ligado para São Bento, pois sabia bem que era aí que R.P.F. habitualmente trabalhava, já que uma vez lhe tinha telefonado para São Bento para elaboração de outra notícia”. Numa matéria desta consequência, em que se tornaria crucial ouvir o principal protagonista, o provedor regista a aparente escassa vontade de encontrar R.P.F., telefonando-se ao fi m do dia (em que presumivelmente já não estaria a trabalhar) e para o local que o jornalista sabia ser errado. A atitude faz lembrar os métodos seguidos num antigo semanário dirigido por um dos actuais líderes políticos (que por ironia tinha por objectivo destruir politicamente C.S., então PM), mas não se coaduna com a seriedade e o rigor de que deve revestir-se uma boa investigação jornalística. Se o jornal já possuía a informação há ano e meio, porquê telefonar ao principal protagonista pouco antes do envio da edição para a tipografi a? É um facto que R.P.F., segundo afi rmou ao provedor, estava então de férias, mas isso não desculpa a insignifi cância do esforço feito para o localizar.
Também J.M.F. reconheceu ao provedor “o erro de tentar encontrar R.P.F. na PCM e não directamente na residência ofi cial do PM”, acrescentando, porém: “Tudo o mais seguiu todas as regras, e só lamentamos que os recados deixados a R.P.F. não se tenham traduzido numa resposta aos nossos jornalistas, que teria sido noticiada de imediato, antes no envio de uma queixa ao provedor – a resposta não impediria que se queixasse na mesma, mas impediu-nos de noticiar a sua posição e de lhe fazer mais perguntas”.
O provedor considera, porém, que nem “tudo o mais seguiu todas as regras”. As notícias do PÚBLICO abalaram os meios políticos nacionais, e o próprio PM as comentou, considerando o seu conteúdo “disparates de Verão”. O assunto era, pois, sufi cientemente grave para o PÚBLICO, como o jornal que lançou a história, confrontar a sua fonte em Belém com uma alternativa: ou produzia meios de prova mais concretos acerca da suposta vigilância de que a PR era vítima (que nunca surgiram) ou teria de se concluir que tudo não passava de um golpe de baixa política destinado a pôr São Bento em xeque. Não tendo havido qualquer remodelação entre os assessores do Presidente da República (PR) nem um desmentido de Belém, era, aliás, legítimo deduzir que o próprio C.S. dava cobertura ao que um dos seus colaboradores dissera ao PÚBLICO. Mais signifi cativo ainda, o PÚBLICO teria indícios de que essa fonte não actuava por iniciativa própria, mas sim a mando do próprio PR – e essa era uma hipótese que, pelo menos jornalisticamente, não poderia ser descartada. Afi nal de contas, o jornal até podia ter um Watergate debaixo do nariz, mas não no sentido que os seus responsáveis calculavam.
No prosseguimento da cobertura do caso, o passo seguinte do PÚBLICO deveria, logicamente, consistir em confrontar o próprio PR com as suas responsabilidades políticas na matéria. Tendo o provedor inquirido das razões dessa inacção, respondeu J.M.F.: “O PÚBLICO tratou de obter um comentário do próprio Presidente, mas isso só foi possível quando este, no dia 28 [de Agosto], compareceu num evento em Querença previamente agendado, ao qual enviámos o nosso correspondente no Algarve. Refi ra-se que, quando percebemos que não conseguiríamos falar directamente com o PR para a sua residência de férias, verifi cámos a sua agenda para perceber quando ia aparecer em público, tendo notado que a notícia saíra da Casa Civil exactamente antes de um período relativamente longo em que o Presidente não tinha agenda pública”.
Em Querença, C.S. limitou-se, porém, a invocar “os problemas do país” e a apelar para “não tentarem desviar as atenções desses problemas”, tendo faltado a pergunta essencial: como pode o PR fazer declarações altruístas sobre a situação nacional e ao mesmo tempo caucionar (se não mesmo instigar) ataques abaixo da cintura lançados de Belém sobre São Bento? E, como qualquer jornalista político sabe, havia muitas maneiras de confrontar a PR com a questão e comunicar ao público a resposta (ou falta dela), não apenas andando atrás do inquilino de Belém.
Do comportamento do PÚBLICO, o provedor conclui que resultou uma atitude objectiva de protecção da PR, fonte das notícias, quanto aos efeitos políticos que as manchetes de 18 e 19 de Agosto acabaram por vir a ter. E isto, independentemente da acumulação de graves erros jornalísticos praticados em todo este processo (entre eles, além dos já antes referidos, permitir que o guião da investigação do PÚBLICO fosse ditado pela fonte da PR), leva à questão mais preocupante, que não pode deixar de se colocar: haverá uma agenda política oculta na actuação deste jornal?
Noutras crónicas, o provedor suscitou já diversas observações sobre procedimentos de que resulta sempre o benefício de determinada área política em detrimento de outra – não importando quais são elas, pois o contrário seria igualmente preocupante. Julga o provedor que não é essa a matriz do PÚBLICO, não corresponde ao seu estatuto editorial e não faz parte do contrato existente com os leitores. É, pois, sobre isso que a direcção deveria dar sinais claros e inequívocos. Não por palavras (pois a coisa mais fácil é pronunciar eloquentes declarações de isenção), mas sim por actos.
Joaquim
Vieira
Provedor
do leitor

segunda-feira, 10 de agosto de 2009


Olha o Podcast fresquinho!

0 comentários


É pró menino e prá menina!